Destaques

[CRÔNICA] AINDA É CEDO PARA COMPREENDER O AMANHÃ

Por Leandro Salgentelli •
sábado, 27 de abril de 2019


ERA UMA SEXTA-FEIRA qualquer. Voltando pra casa, conversando com o Uber sobre o cenário emblemático político e sobre as malesas da vida, foi quando avistei uma frase no para-choque do carro à frente, diante do sinal vermelho. A frase dizia: você é mais forte do que se imagina. Guardei aquela frase no bolso e seguimos a vida.

 Foi um ano difícil, pra todos, suponho. E ser forte diante de tantas baixas foi um alento. Poderia fazer uma retrospectiva do que aconteceu este ano, mas não é necessário. Faça uma lista aí das vezes que tiveram que ser forte. Foram inúmeras, não é mesmo?

 Neste último ano parei de escrever. Consigo contar quantos textos saíram do papel – foram no máximo cinco durante todo o ano. E isso me trouxe certo desespero porque necessito da palavra. Compreendo-me com as palavras e percebo que é reciproco. Mas precisava dar essa pausa. Falar menos possível. Desapegar daquilo que mais amo fazer.

 Durante esse período também li poucos livros. Eu precisava me desconectar – mesmo diante da insônia, que é o momento onde a criatividade abre às portas, não escrevi nada. Nenhum bilhetinho na cabeceira da cama.

 Nesse hiato, percebi que a gente se materializa para dar sentido à vida. A gente se apega a alguns hábitos para dar conta do infinito que somos. E compreender esse infinito não é fácil. Somos abstratos – foi o que descobri também nessa inércia.

 E diante de tantas rupturas, diante de tantos desencontros, medo, insegurança, penso que tudo aquilo que não consigo compreender hoje algum dia a de fazer sentido. Afinal, qual é o sentido de viver se não desapegar do passado, deixar de lado a expectativa do futuro de lado e viver o hoje?

 E por falar em hoje, sou tão grato a tudo que me aconteceu. Sou tão grato pelas pessoas que conheci... E consigo perceber, hoje, que durante esse percurso rumo à transgressão fui mais forte do que imaginava. Ah, eu fui...

 Portanto, depois de tantas palavras escorridas pelos meus dedos, depois de tantos hiatos, vejo que a expectativa exacerbada não me alcança mais, como também não me atinge aquele passado que me trouxe até aqui.
  
 A maior força é constatar que ainda é cedo demais para compreender o que acontece amanhã. E o que eu sei de fato sobre o amanhã é que tenho uma viagem marcada para o Rio de Janeiro e que volto qualquer hora dessas. Ainda são duas da tarde, e enquanto a chuva não cessa há um exemplar de Em busca do tempo perdido, de Marcel Proust, na estante. Os lençóis estão limpos e tenho o dia todo.

Por: Leandro Salgentelli 

Comentários via Facebook

1 comentários:

  1. Francine S. C. Camargo29 de abril de 2019 14:14

    Leandro, sempre vivi no "no stop", até que não tive outra saída se não respeitar tudo em mim que gritava para que eu aquietasse a mente. Foi o que me permitiu ser o que eu queria ser. Bate aqui! Nesse recomeço, o gosto é diferente, os lençois parecem mais limpos e o tempo parece correr numa velocidade diferente agora. Beijo e obrigada por compartilhar conosco.

    ResponderExcluir

Deixe sua opinião para nós do Refúgio Literário

Publicidade

iunique studio criativo

Instagram

    © Refúgio Literário – In Livros